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Archive for the ‘Cora Ronai’ Category

#prontofalei – Cora Ronai

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Achei perfeitamente ridícula a atitude da Black Bloc que decidiu pedir “asilo político” à Argentina. Perdão, mas o que é que ela esperava? Que sair quebrando as coisas por aí — ou ajudando outros a quebrarem, tanto faz — não fosse dar galho? Que o Exército a condecorasse com a Medalha do Pacificador no dia 7 de setembro?

Não sabe brincar não desce pro play, pombas.

Por conta disso, levei umas chamadas do pessoal que apóia os Black Blocs, lamentando o meu “equívoco”. Para eles, os BBs existem para “defender os manifestantes da tropa de choque” e “o direito de ir e vir das pessoas”.

Ah bom, desculpem — eu me esqueci que vocês são os novos Heróis Incompreendidos da Pátria! Pena que, até agora, tudo o que tenham conseguido fazer tenha sido o jogo do poder, afastando a população das ruas. Ou vocês acham que podem quebrar tudo por onde passam impunemente, e que todos vão achar bonitinho e agradecer pelo favor?

Em que mundo vocês vivem?!

Lamento, mas o que vocês estão fazendo tem um bom nome genérico: palhaçada. Então vocês acham que aquele monte de gente que foi para as ruas em junho não gostaria de repetir a dose em setembro? E vocês acham que as pessoas só não foram às ruas porque preferiram ficar em casa, hipnotizadas pelo Poder Maléfico da Globo?

Ora, tirando o sequestro das manifestações por Black Blocs, Ninjas & similares, nada mudou desde então; a corrupção continua a mesma, o governo continua cagando e andando para o povo e o grito de todos nós, brasileiros, continua entalado na garganta.

E, ainda assim, ninguém foi às ruas.

Acontece que a maioria das pessoas, a vasta, imensa maioria, quer se manifestar EM PAZ — e essa maioria perdeu esse seu direito porque uma minoria colonizada que não tem vergonha de usar nome em inglês para se auto definir e de queimar a bandeira nacional acha que manifestação tem que ter quebra-quebra para que “o governo entenda”.

Violência gera violência. Quando vocês vão para a rua brincar de guerra com a carinha coberta a polícia aceita alegremente o desafio: descer o pau nos outros é com ela mesma. Em português, chama-se a essa atitude temerária de cutucar a onça com a vara curta, ou “to poke the jaguar with a short stick”, para falar na língua dos Black Blocs.

Quem perdeu o direito de ir e vir fomos nós, brasileiros comuns — a quem vocês chamam de coxinhas ou de reacionários, porque acreditamos que virar lixeira, saquear loja, destruir banca de jornal, incendiar carro de reportagem, quebrar mobiliário urbano e agência bancária é coisa de cafajeste.

Nós sim, perdemos o sagrado direito de irmos para as ruas e de nos manifestarmos, sem cair no meio de uma batalha campal. Tudo o que a polícia não precisa é do incentivo de mascarados baderneiros para vir com tudo para cima da população; já nos basta termos que enfrentá-la como ela é, sem o seu precioso auxílio.

A essa altura, graças a vocês, o que poderia ter sido uma linda festa de cidadania, com milhões de brasileiros protestando nas ruas, acabou sendo mais uma bisonha demonstração de intolerância — vencida, com folga, pela polícia. Que vai, a despeito de sua criminosa brutalidade, conquistando o apoio da população, diante da destruição fútil e cotidiana das ruas da sua cidade.

É isso mesmo que vocês querem?

O governo, nem preciso dizer, está com o peito em festa e o coração a gargalhar. Assim que voltar de Paris, Sérgio Cabral vai contratar Eike Batista para instalar a estátua de um grupo de Black Blocs na Cinelândia, em agradecimento aos inestimáveis serviços prestados.

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No reino da boçalidade – Cora Ronai

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E aí, um dia, a gente recebe uma carta como essa:

“Peço-lhe desculpas por chateá-la com assunto dessa natureza. Infelizmente ainda há pessoas que acreditam que não pode acontecer com elas passarem por tanto constrangimento quando precisam da “nossa” polícia.

Meu sobrinho vem, há alguns anos, meio perdido na vida. Sou professora, graduada e pós-graduada, crio-o desde os sete anos (hoje está com 29) porque a mãe sumiu no mundo e o pai, meu irmão, morreu quando o menino contava apenas dois meses. Temperamento difícil somado à revolta pelo abandono levaram-no às drogas; para manter o vício, foi levado aos assaltos.

Imagine como sofro, pois tentei dar-lhe carinho e educação. Quando pequeno, levei-o a vários médicos e terapeutas. Crescido, dizia que não tinha problema e vivia a sua maneira. está preso, pela segunda vez. Condenado, aguarda sua transferência para Bangu em uma casa de custódia em Engenheiro Pedreira, distrito de Japeri, interior do Rio de Janeiro.

Cheguei há pouco de lá. Estou arrasada. Não consigo entender por que alguns funcionários (infelizmente, maioria) do Sistema de Administração Penitenciária tratam-nos, parentes dos presos, com tanto sarcasmo e desrespeito. Imagino como os presos são tratados. Sei que violaram as leis, sei que muitos oferecem perigo à população, sei que não devem ter mordomias. Não deveria haver mordomia para ninguém que violasse as leis, inclusive os políticos corruptos, os criminosos de colarinho branco. Apenas acredito que, como cristãos, devemos tentar ajudar essas pessoas a viver de forma diferente. Acredito que educando, orientando para o trabalho, ocupando esses jovens, tornando-os úteis, chegaremos a uma realidade tão desejada, ou seja, construiremos e investiremos em escolas e universidades e não precisaremos construir mais presídios.

Levei para meu sobrinho uma manta de fibra sintética, cor cinza exigida pela casa de custódia. O inspetor disse que não poderia ser entregue. Eu perguntei por quê. Ele, rindo e caçoando, recomendou-me passar pelas ruas à noite, observar bem os mendigos e roubar de um deles um dos cobertores que usam, bem “vagabundinhos”, que é o que pode entrar para o preso.

Você talvez dirá que eu deva procurar a corregedoria. Não é a primeira vez que passo por constrangimentos ou que os testemunhe. Você faz ideia do que pode acontecer ao meu sobrinho se eu fizer a reclamação? Precisa responder? Que país é esse em que não se pode confiar na força policial? Em todo esse tempo de luta (mais ou menos 15 anos) tentando recuperar esse jovem, encontrei apenas alguns poucos policiais que mereciam confiança.

Apenas alguns poucos, Cora. Apenas.

Sou professora. Acredito na Educação. Sou cristã. Não desisto. Perdoe-me o
desabafo. Abraços,

Norma Suely”

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Não sei o que dizer para a Norma Suely. Não sei o que responder a uma carta assim. Não tenho coragem de recomendar que tenha paciência, porque eu não teria. Não tenho como pedir que tenha fé, porque eu não acredito. Não posso insinuar que as coisas vão melhorar, porque eu estaria mentindo: o Brasil que vejo piora a cada dia. Fizemos alguns progressos na área social, dizem que há menos miseráveis e é possível que isso seja verdade, mas nunca tivemos uma população tão mal preparada, tão mal educada, tão boçal. Um guarda que destrata os parentes dos presos é reflexo disso. Uma diretoria de presídio que permite este tipo de achincalhe também.

Não basta o país ter a capacidade de transformar miseráveis em pobres. Mais importante do que isso é pensar a longo prazo, é criar uma escola que funcione, da qual os jovens saiam com ferramentas de real progresso nas mãos, em vez de diplomas que, cada vez mais, valem cada vez menos. É entender que educação é, também, um conjunto de valores que forma pessoas melhores e mais humanas. O guarda que fez troça da Norma Suely aprendeu a ler e escrever, mas não sabe nada.

o O o

Escrevo de Bogotá. Quando o avião decolou do Rio, o comandante da Avianca fez uma homenagem emocionada à equipe de judô que participou do mundial do Rio, e que voltava para casa naquele vôo. Concluiu dizendo que jovens como aqueles reafirmavam o seu orgulho de ser colombiano. O casal brasileiro que ia à minha frente deu uma risadinha: “Orgulho de ser colombiano? Ha ha!”

Espero que, ao desembarcarmos, tenham mordido a língua com bastante força: o aeroporto internacional Eldorado bota no chinelo o patético Galeão, cada vez mais deprimente. E não é só a porta de entrada que impressiona. Os anos negros da guerrilha ficaram para trás (FARC e governo estão em negociações para por fim ao conflito), a produção de drogas caiu drasticamente e o país, que vive um bom momento econômico, é uma grata surpresa: Bogotá é uma cidade ao mesmo tempo sofisticada e acolhedora, que sabe preservar a sua cultura. Tem museus de padrão internacional, bibliotecas públicas de cair o queixo e ruas limpas e seguras, patrulhadas por duplas de policiais e lindos cães de todas as raças.

Acima de tudo, porém, tem uma população super gentil e educada, que capricha na cortesia como estilo de vida. Eles tem mais é que ter orgulho, muito orgulho, do seu país.

(O Globo, Economia, 5.9.2013)

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Médicos estrangeiros – Cora Ronai

Quando os primeiros médicos estrangeiros chegaram ao Brasil, o jornal trouxe a foto de uma jovem espanhola, acompanhada do filhinho. Ela veio trabalhar numa aldeia indígena no Amazonas, e fiquei, confesso, com uma ponta de inveja: se eu fosse jovem e médica, este é um trabalho que teria adorado fazer. Pensei na sorte do garotinho, que tão pequeno terá a chance única de mergulhar numa cultura completamente diferente da sua, e nas ricas lembranças que mãe e filho levarão pela vida afora.

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Senti carinho pela médica e por seu menino, como sinto carinho por todos os profissionais que se dispõem a sair da sua zona de conforto para cuidar do nosso planeta e de seus habitantes. Sou grata aos médicos que vieram para o Brasil cuidar dos meus compatriotas desassistidos dos cafundós, embora, como todo mundo, tenha sérias dúvidas a respeito do que poderão fazer sem um mínimo de condições. Se nos hospitais do Rio falta de tudo, de soro a esparadrapo, ninguém precisa de muita imaginação para adivinhar o cenário desolador que os espera.

Há quem reclame que os estrangeiros foram dispensados do Revalida. É uma reclamação justa, ainda que inútil, dadas as circunstâncias. Imagino que o exame sirva para comprovar até que ponto os profissionais estão familiarizados com a medicina atual, mas se há uma coisa que os estrangeiros não vão encontrar nas cidades para onde estão sendo designados é medicina atual: poderão requisitar o mais elementar Raio-X? Ou um hemograma que fique pronto antes de ficar desatualizado? Terão ao menos material de sutura? Antibióticos? Vermífugos?

Quer dizer: serão, na prática, pouco mais que curandeiros, por melhor que tenha sido a sua formação. E, ainda assim, é possível que alguns se saiam muito bem, porque há pessoas que tem o dom de curar com um nada. Um dos grandes livros que li, e que recomendo a todos os angloparlantes, é “The cunning man”, do médico e escritor canadense Robertson Davies, que conta a história de um desses extraordinários curadores.

Há quem reclame também que os médicos não vão conseguir se entender com os seus pacientes por não saberem falar português. Isso é detalhe, e não muito importante. Em que língua a jovem médica espanhola vai se comunicar com os índios? Aliás, em que língua se comunicam os médicos da Funai com tribos recém-descobertas? E os Médicos sem Fronteiras, que vêm de todos os países do mundo e vão para onde são necessários?

Levando o exemplo ao extremo, não custa lembrar que os bons veterinários sempre trataram toda a sorte de bichos com bastante sucesso, sem entender uma só palavra do que miam ou relincham.

O fato é que se há pessoas sem médicos em algum lugar, e se há médicos dispostos a atendê-las, temos mais é que recebê-los de braços abertos, sejam turcos, chilenos ou imenitas. Não chego ao extremo de dizer que é melhor um mau médico do que médico nenhum, porque os maus médicos matam mais do que a natureza sozinha — mas até sob este aspecto os estrangeiros não poderão fazer muita coisa, por absoluta falta de condições e de medicamentos.

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Dito isso, acho escandalosa, ultrajante mesmo, a importação dos médicos cubanos. Não por serem cubanos, é óbvio, nem por duvidar da qualidade da sua formação, mas pela forma enviesada como a questão foi e está sendo conduzida. Nada justifica a proibição de trazerem consigo as suas famílias; nada justifica que o governo cubano receba os seus salários; nada justifica que o Brasil, um país que se quer democrático, compactue com essa mercantilização que transforma pessoas em commodities.

Os defensores do tráfico humano alegam que, consultados, os médicos cubanos não se queixam, e que, para eles, qualquer quantia que venham a receber, por menor que seja, será superior ao que receberiam em Cuba. É um argumento ofensivo, que considera correta uma remuneração vil porque, em outros países, poderia ser pior. Ora, assim se pode justificar qualquer afronta à dignidade humana, a começar pela semi-escravidão dos costureiros bolivianos que trabalham para as grifes de luxo de São Paulo: por incrível que pareça, eles também estariam em pior situação em La Paz.

O artigo 461 da CLT é claro. Ele estipula que trabalhadores com função idêntica, exercendo idênticas tarefas para o mesmo empregador, devem receber salários iguais, sem distinção de sexo, idade ou nacionalidade.

Chama-se a isso justiça. Enquanto os médicos cubanos não tiverem condições de trabalho iguais às dos demais médicos estrangeiros, o Brasil estará compactuando com uma forma de servidão aviltante, que não lança desdouro sobre o servidor, mas cobre de vergonha indelével o empregador.

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Ah, sim: como fica a situação dos brasileiros formados em Cuba que estão aproveitando o programa do governo para voltar ao Brasil? Pouco ouvi falar sobre eles, e menos ainda sobre a sua situação legal. O seu dinheiro também será enviado para Havana? Ficarão dispensados do Revalida mesmo trabalhando em seu (nosso) próprio país?

(O Globo, Segundo Caderno, 29.8.2013)

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Mídia Ninja – Cora Ronai

O papo na rede social foi a Mídia Ninja, que deu entrevista ao “Roda viva” representada por Bruno Torturra e Pablo Capilé. Infelizmente, acho que foi desperdiçada uma boa oportunidade de troca de ideias, menos pelos ninjas, diga-se, do que pelos entrevistadores, que insistiam — compreensivelmente, até — em entender de onde vem o dinheiro que financia os ninjas e qual o seu “modelo de negócios”.

Não diminuo a importância desse, digamos, “detalhe” — eu mesma fiquei bastante desapontada quando soube que, por trás do que eu imaginava ser um movimento espontâneo, estavam, pelo menos em parte, grana e estímulo do governo. Não porque seja condenável receber dinheiro público, mas porque não confio em quem se diz independente e auto sustentável enquanto, por trás, recebe uma quantia não especificada de recursos que, por serem nossos, deveriam ser bem explicados. As informações que Capilé deu sobre isso, aliás, foram absurdas: o Fora do Eixo, sistema que é a nave mãe da Mídia Ninja, não trabalha com reais, mas com estalecas, patacas ou algo do genero. Então tá.

Apesar disso, eu teria de fato preferido uma conversa que fosse mais fundo em métodos de trabalho, escolhas de pauta e, sobretudo, possibilidades de crescimento e multiplicação do modelo ninja de transmissão de notícias, porque o processo é interessante e tem muitas possibilidades.

Ao contrário do que me pareceu ser percepção geral no programa e na própria rede, não vejo o mundo dividido entre “mídia clássica” de um lado e “mídia ninja” de outro, como se a existência do modelo tradicional de jornalismo estivesse ameaçada pela emergência do jornalismo participativo. O modelo tradicional de jornalismo anda abalado pelo desenvolvimento da web, que veio bem antes dos ninjas e que mudou, de forma drástica, a maneira como nos informamos.

Na web, todo cidadão pode ser, em tese, fornecedor de notícias. O mérito da mídia ninja é reunir alguns desses cidadãos num projeto comum, oferecendo-lhes o canal para chegar ao público; é juntar debaixo do mesmo teto virtual fabricantes de conteúdo que, antes, espalhavam-se pelas mídias sociais, dando-lhes, de quebra, a oportunidade de mostrarem o que vêem em tempo real. O proto-ninja Abraham Zapruder, mais famoso dos cinegrafistas amadores, teria adorado tudo isso.

Pessoalmente, acho que as mídias que convivem num mesmo espaço de tempo se complementam, se influenciam e se transformam a partir desse convívio. Não existem mais — se é que alguma vez existiram — áreas estanques ou impermeáveis no planeta comunicação.

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A certa altura do “Roda Viva”, um entrevistador destacou como grande tento da Mídia Ninja ter ido parar no Jornal Nacional, que precisou usar imagens do coletivo. Mas claro, ué: todos os jornais do mundo sempre usaram, e continuarão a usar, cada vez mais, imagens de agências de notícias, de gente que ia passando e até mesmo de outras emissoras. A Mídia Ninja é um pouco disso tudo.

Ainda não inventaram, e eu espero que não inventem nunca, emissora capaz de estar em todos os lugares ao mesmo tempo.

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Acho que faltou à entrevista, também, a discussão de um ponto fundamental. Não há como negar que a Mídia Ninja tem feito um trabalho dinâmico e valente, e que é em parte graças às suas imagens que as farsas da polícia vêm sendo desmontadas; mas fico com a sensação amarga de que algo está fora do meu campo de compreensão quando vejo os ninjas filmando os jornalistas da mídia tradicional sendo agredidos e enxotados das manifestações sem fazer um só gesto em sua defesa.

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Aliás: acho a expulsão da mídia tradicional das manifestações uma demonstração de intolerância insuportável. Não gosta da Record? Mude de canal. Odeia a Globo? Desligue a TV. Não suporta a Band? Não dê declarações a ela se for procurado. Está de bom tamanho. Cabe ao público, em última instância, decidir o que quer ver, ler, ouvir. Achar que “o povo” precisa que manifestantes queimem os carros da reportagem e agridam os jornalistas para “não ser manipulado” é de uma arrogância que beira o fascismo.

Tenho falado muito a respeito disso na internet, porque venho de um tempo em que lutávamos, ao contrário, para ter uma imprensa livre e plural. Trabalhei alguns anos sob censura e não foi bom; visitei países quem têm apenas um ou dois jornais e não gostei.

Alguns jovens tentam me explicar, bondosamente, que as agressões não são contra as pessoas, mas contra as empresas. Sei que a minha idade impede que eu entenda coisas simples como essa, mas relevem, por favor.

É que, na minha época, o soco doía na pessoa física que acertava, e não na pessoa jurídica que a empregava.

(O Globo, Segundo Caderno, 8.8.2013)

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O ocaso dos blogs – Cora Ronai

“Sábado de madrugada, depois de dar comida pra Famiglia Gatto e checar minha mailbox, comecei a brincar com este blog. Deviam ser umas duas da manhã. Agora são quatro e tanto (vocês podem checar pela marca da hora, aí embaixo) e, finalmente, a coisa parece estar funcionando. Por que demorou tanto? Porque eu sou fresca e levei horas escolhendo um template legal e fazendo nele as modificações que me pareceram necessárias. Com o tempo, se eu tiver paciência — e talvez tenha — vou tentar incluir fotos e inventar outras gracinhas. Por enquanto, até para poder fazer uma avaliação legal do Blogger, estou trabalhando apenas com os recursos mais óbvios, e deixando este blog hospedado gratuitamente no Blogspot.”

Esta nota, publicada no dia 26 de agosto de 2001 sob o título “Este pode ser o começo de uma bela aventura”, foi o primeiro post do meu blog internetc. Eu havia experimentado outras soluções antes, quase engrenei com o LiveJournal, mas foi no Blogger que encontrei a ferramenta prática e amistosa que me permitiu tomar gosto pela coisa.

Criado em 1999, o Blogger ainda estava em pleno desenvolvimento. O permalink — o URL de cada post — havia sido lançado em 2000, e os sistemas de comentários ainda eram feitos, e hospedados, por voluntários abnegados; o Blogger só viria a ter um sistema próprio em 2004, depois de ter sido comprado pelo Google. Até lá, usei uma quantidade de sistemas diferentes, até que um colega blogueiro, Fabio Sampaio, me ofereceu uma vaga no seu excelente Falou e Disse, do qual tenho saudades até hoje.

Até 11 de setembro de 2001, os blogs eram considerados web brinquedinhos. Aí houve o ataque terrorista aos Estados Unidos. Enquanto os sites dos jornais e das emissoras de TV saíam do ar, derrubados pelo excesso de tráfico, os blogueiros nova iorquinos contavam ao mundo o que estava acontecendo. Depois disso, ninguém mais achou que o blog, como ferramenta, era bobagem.

Mas , de uns tempos para cá, os blogs vêm perdendo muita força. Seu lugar como ponto de encontro — “botequins virtuais” — vem sendo tomado pelo Facebook, onde todo mundo é, de certa forma, blogueiro — e todo mundo se esbarra automaticamente. Na época áurea dos blogs — aí por meados da década 2000-2010 — os blogs tinham listas dos blogs amigos, que visitávamos com maior ou menor assiduidade.

A blogosfera era mais singela e muito mais interessante, já que cada blog tinha o seu jeitinho particular de ser. Mas o mundo gira, a Lusitana roda e, mesmo com a pior interface da galáxia, o Facebook ganhou a parada, já que facilitou muito a interação entre quem escreve, quem lê e quem só quer marcar o local e o horário da próxima manifestação. Como todos os blogs, o internetc. também foi vítima da mídia social. As discussões vibrantes que aconteciam em suas caixas de comentários se transferiram para o Facebook, onde ganhou uma repercussão que nunca teve enquanto viveu solto no espaço.

No começo do ano, decidi acabar com o internetc., hoje hospedado no WordPress. Decidi também esperar até agosto, para que ele pudesse completar 12 anos. Foi uma boa ideia, porque pude pensar mais sobre o assunto. Não teria coração para matá-lo de vez, mesmo porque ele ainda tem seu uso: é ótimo como repositório de textos. De modo que resolvi mantê-lo no ar para republicar as colunas daqui do jornal e um ou outro texto solto, desabilitando, porém, as caixas de comentários. Ninguém consegue manter Twitter, Facebook e blog e ter, ao mesmo tempo, uma vida longe do computador.

Meu amigo Jean Boechat, outro blogueiro das antigas, comentava no Twitter, ainda outro dia:

“eu digo desde sempre. frase do @tonydemarco. eu tenho um blog morto que completará 13 anos, acho. haha.”

(O Globo, Economia, 3.8.2013)

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